segunda-feira, janeiro 31, 2005


Hienas

Para quem, como eu, registou o percurso desse grande democrata, desse homem de causas, de punho cerrado contra peito entaipado, desse – também! - jurisconsulto de convicções ferradas, dessa língua despapada (...), de seu nome, Garcia Pereira, condói a alma saber que já não vai poder erguer sua voz de tessitura rachada, mas serena, proferindo o seu mais emblemático grito de guerra hasteado neste período pós revolucionário: Ele mente com todos os dentes que tem na boca...!


Miguel Relvas está convicto da vitória do PSD

sexta-feira, janeiro 28, 2005


Let sleeping dogs lie

Santana Lopes quer processar as empresas de sondagens se não se confirmarem as previsões por estas feitas. "As responsabilidades vão ser pedidas!" anunciou em Olhão.

Não sei não, a mim parece-me um pedaço suicida Santana trazer à praça pública a peregrina ideia de pedir responsabilidades...


Esta rapaziada

Tem ideias muito giras e originais, com um sentido do prioritário bastante aguçado. O secretário-geral é, sem dúvida, muito inspirador.

quarta-feira, janeiro 26, 2005


Um docinho

Para os meus colegas de blog, JoãoG e Filipe, cujas alegrias desportivas são tão raras como escassas as suas vitórias no Euromilhões: sinceros parabéns!

Extensíveis ao mfc, ilustre lampioum do nuórte e demais vermelhuscos de estimação.

(nós, dragões, temos imenso fair-play quando assistimos a jogos a feijões)



Alarmistas!




Sou eu que sou pouco sensível, ou a vaga que é ténue?


Ressuscitou

Ou a notícia da sua morte foi um exagero. Importam-se de repor o link ali ao lado, que os fedorentos estão alive and kicking...?

terça-feira, janeiro 25, 2005


A parelha

Vejo, pelo blogamemucho, que os cartazes gigantes de Portas e de Louçã fazem parelha em mais do que uma rotunda emblemática. Não é só aqui em Lisboa, na Praça de Espanha, que os encontramos juntinhos, o mesmo acontece na rotunda dos Produtos Estrela (que nome evocativo, deviam passar a chamar à Praça de Espanha a rotunda dos Subprodutos do Gasóleo e da Gasolina). Tanto quanto sei, também estão aninhados na rotunda dos Produtos Delta, em Vila Viçosa e na rotunda dos Subprodutos do Jardim, Adubos e Similares, no Funchal. Vai-se a ver e é uma tendência nacional: em cada cidade, Portas e Louçã, de olhos nos olhos, numa grande rotunda perto de nós.

O que nos leva ao debate entre os dois dos cartazes e à boutade final. Por qualquer das perspectivas, que tiro na base de apoio!

Se Louçã queria mesmo significar que Portas não tem legitimidade para falar do aborto por não ser progenitor, então Roberto Carneiro é para o Bloco o especialista mor em interrupção voluntária da gravidez?

Se Louçã queria implicar que os homossexuais (dando guarida à vox populi sobre a opção sexual de Portas) não têm legitimidade para falar do aborto, que absurdo mais ecuménico e suicida.

Se queria apenas chamar a atenção para as eventuais escolhas sexuais do opositor, de longe o mais provável, que lerdo (eu ia escrever merdoso, mas, como tenho sido chamada à atenção pelos meus co-guardadores pelo uso de vernáculo no blog, vou evitar).

Só vos digo que, entre o Louçã e o besugo (estimado peixe, o país precisava lá de mais um argumento, que não o do apurado bom gosto, para torcer pelo Porto? numa nação que delira com a desgraça alheia, era preciso prometer silícios se o lagarto não chegasse ao pódio?) a dourar a imagem do Paulinho das marchas, o homem ainda aprende a tocar rabecão e depois admirem-se quando chegar a principal opositor do Zapatero Sócrates.

sexta-feira, janeiro 21, 2005


Na massa do sangue



O Silva é um digníssimo gestor de empresas públicas ou de capital maioritariamente público. Indiferente à rotatividade partidária na governação - o partido a que está afecto tem sempre quota garantida no bem comum e ele vive demasiado conectado para cair da proverbial carroça - vai cumulando directorias, regalias e demais mordomias.

Não é muito competente, nem por aí eficiente, mas a visão cilíndrica e o discurso redondo evitam-lhe grandes fífias nos momentos agudos. Depois, conhece todo o mundo e ninguém, sabe onde estão enterrados os cadáveres e quais os telhados de vidro mais frágeis. Adapta-se bem aos diversos ambientes, confunde-se lindamente com a vegetação e tem um apurado instinto de presa, perseguindo com notável sucesso objectos em movimento.

Provém de uma família com tradição no clientelismo e apelido recorrente nos anais da república. O avô Silva usava "cuidar dos seus". Não era de mexer cordelinhos em favor dos filhos - pelo contrário, incutiu-lhes a paixão de vencer por mérito - mas puxava com mestria os fios para salvaguardar os interesses de pessoas a quem entendia dever solidariedades de berço e vida. Que eram muitas. A gente da sua terra. Os que para ele trabalhavam, os que o haviam ensinado, os que o tinham amado e os que lhe faziam o favor de ser seus amigos.

Era a época do apadrinhamento. Em que até para contínuo se entrava por pedido e os camponeses vinham para a cidade com um nome no bolso. O probo avô Silva, apontado como íntegro e incorruptível pelo seu mundo, decerto nunca pensou que havia homens sem nome no bolso. Em sua defesa se diga que para aquela geração a igualdade era conceito e a caridade virtude.

Per natura, a geração da mãe Silva foi revolucionária. E ela era uma mulher do seu tempo. Pelos homens sem nome no bolso, contra a caridadezinha, marchou, marchou... As solidariedades eram outras e o favorecimento uma arma ao serviço de ânsias reformistas. Em sua defesa se diga que para aquela época estava no lugar certo. O que só a beneficiou. E aos seus. Il faut que quelque chose change pour que tout reste le même.

Ontem telefonei ao Silva neto para cobrar dívida antiga com um favor pessoal. Nada que o obrigasse a infringir códigos ou mesmo éticas, dado, inclusive, o preço da ética nos dias de hoje. Ele ficou contente por me ter pago, quase vindicado. Já eu sinto-me um pedaço cefalópode e, por mais que tente, não consigo lavar bem o tentáculo.

quarta-feira, janeiro 19, 2005


Rafting



Éramos cinco de seis amigos que todos os anos se juntam para recordar uma épica viagem de fim de curso. Desta vez, o programa de festas passava por um fim–de–semana de male bonding no rafting. A coisa foi apresentada como sendo um desporto radical, próprio para "limpar" a cabeça de quem passa tanto tempo na cidade, e bom para fazer subir a adrenalina aos poros de peles ambientalmente sujas e artificialmente envelhecidas.

Fato de mergulho, capacete e pagaia na mão, à boa maneira da nossa hierarquia militar, faziam de nós todos uns valentes chouriços. Quatro dos heróis estão declarados pela comunidade amiga como obesos. Nem o melhor pintor teria frieza suficiente para pintar este quadro sem forte ataque de riso.

Chegada a hora tão esperada, a da subida para o barco de borracha, logo ali se provaram as dificuldades que nos esperavam naqueles quinze quilómetros de descida de rápidos sub-infantis. Duas remadas, uma entrada num rápido de trinta centímetros de fundura e "gordo" ao banho. De pronto a solidariedade de amigos inseparáveis veio ao de cima… risota generalizada e gordo às cambalhotas agarrado em pânico a uma corda do bote.

Depois de o fazer regressar à companhia da restante tripulação, eis que estávamos mais uma vez perante um rápido, este para Homens de barba rija: tinha quarenta e cinco centímetros de altura e uma bravura de fazer corar qualquer salmão à procura de poiso para a desova. Três remadas, uma lomba de água, barco para a direita e obesos para a esquerda… áaaaaaaaaagua. Coitados, quatro bóias de sinalização e um tronco à deriva.

Refeitos desta paródia, os cinco bacalhaus de molho regressaram com vontade para fazer um salto de sete metros em direcção ao centro de ebulição (o ponto mais fundo do rio): um rápido de grau 5. Isto sim, fez esquecer todos os problemas que nos acompanham no cantinho mais recôndito da cabeça. Saltoooooooooooooooooo que quando viemos à tona de água ainda sentíamos as pernas a tremer e o coração aos pulos lá para os dedos dos pés.

O restante percurso é de uma beleza paisagística tal que só nos fez pensar quanto é bom viver na serra e ter pequenos prazeres saudáveis, como pescar bogas ou assar chouriços caseiros debaixo de um carvalho ao anoitecer. O stress aqui não faz sentido nem consta do dicionário.

Para o ano, um novo evento, com a certeza de juntar cinco ou seis amigos que jamais voltarão costas uns aos outros, independentemente do que possa acontecer na vida de cada um. Na terra, na água ou no ar, como foi prometido pelo próximo mordomo, o mais importante da vida são os AMIGOS.

Um bem-haja para quem organizou este fim-de-semana, e que mais vai organizar com toda a certeza. Um gordo, viva! Dois gordos, viva! viva!… … …

terça-feira, janeiro 18, 2005


With a little help from my friends



Há semanas que, pela sua intensidade, nos obrigam a parar ou, melhor dizendo, a tentar digerir, a tentar compreender como é que o cenário que nos rodeava foi, repentinamente e sem aviso, estiolado, envolvendo-nos nas cores diluídas do desconforto.

Nesses momentos de perturbação, a estupefacção inicial dá lugar à revolta e esta à interrogação, ou vice-versa, tanto faz, penso que dançam juntas.

Ainda que o conflito não seja nosso – e, muitas vezes, sobretudo quando o não é – quer a verbalização (sempre esperada como potencial para o intensificar), quer a não verbalização (imperdoável pela pouca dimensão que se lhe pretende reconhecer) são entendidas como agressão maior.

Não raro, nestas circunstâncias, os litigantes – e o Freud explicou isto de certeza – usam as poucas munições que lhes restam para atingir o novo alvo que teve a ousadia de não engrandecer a disputa.

Quando este nonsense me agride – e isso acontece a todos – lembro-me sempre das palavras de Shantideva, no Bodhichary’avatara:

Há quem me despreze, porque hei-de alegrar-me por ser louvado?
Há quem me elogie, porque hei-de afligir-me por ser denegrido?


Coincidentemente, sem suspeitarem sequer das cores pardas do meu cenário, alguns dos meus amigos (desculpem-me os que não conheço pessoalmente e que de forma abusiva incluo nesse grupo) ofereceram-me – dentro e fora da blogosfera – momentos inesquecíveis, enlaços, referências imerecidas, felicitações sem possibilidade de contraditório, poemas ditos e o favor dos gestos e da palavra que estão para além de qualquer adjectivação.

Não vou nomeá-los – porque nenhum o fez com o intuito de ser retribuído e, ainda, porque seria injusto deixar de fora os que preferem o anonimato – mas tenho a certeza que cada um se reconhece nas dádivas que mencionei.

Era inevitável que, neste contexto, (ai a chatice das citações!) me lembrasse desse poema de Leaves of Grass:

O ME! O life!... of the questions of these recurring;
… …
The question, O me! So sad, recurring – what good
Amid these, O me, O life?
Answer.
That you are here – that life exists, and identity;
That the powerful play goes on, and you will contribute
A verse


Não sendo este o sentido que Whitman lhe quis dar, reduzo a escala (ele continua grande) e uso-o para agradecer a todos os que, nestes dias, me fizeram o carinho de contribuir com um verso.

segunda-feira, janeiro 17, 2005


Diz o nu...

Santana Lopes acusa José Sócrates de uma sucessão de "inacreditáveis trapalhadas".

domingo, janeiro 16, 2005


Femme actuelle

Não mais voltara a entrar na universidade desde a licenciatura. Sem que tivesse más recordações, mas embirrava com reuniões de eterna saudade.

Também não ouvia a música da sua adolescência. Ou lia os mesmos autores. Ou via os mesmos filmes. Quem fica preso aos usos de juventude cristaliza, costumava dizer. E não tinha paciência para poliedros.

Olvidara os velhos amores e nunca regressara a lugares onde fora feliz. Finito. Ninguém volta ao que acabou.

A sua crença no presente era tão forte que havia, de facto, esquecido o passado. Senhora de uma memória segura para números e factos de natureza profissional, raramente conseguia situar uma cara ou recriar uma época.

Por isso se apaixonou segunda vez pelo mesmo homem. Ele tinha um ar novinho, pouco usado e atraente. Um sorriso de criança a decorar uma boa cabeça. Continuava tão pegajoso e dependente como nos velhos tempos. Mas ela, claro, não se lembrava disso.

É o que dá obliterar o ontem: repetem-se os erros, mas com imensa frescura.

quinta-feira, janeiro 13, 2005


O homem da hérnia

Era vítima de contradição insanável entre um ritmo circadiano boémio e uma vida com exigências matinais. Logo, tinha insónias. Nada convencia a estroina da glândula a segregar picos de melatonina a horas decentes. Resultado, insónias. E nem pensar em iludir o corpo valdevinos com o embuste da exaustão. Insónias, mesmo.

Assim, habituara-se de criança a exercícios de concentração que ocupavam gradualmente todo o espaço disponível de memória, sem suscitar entusiasmos nem despertar adrenalinas, até ao embalo da total dolência antecessora do sono.

Um dos mais antigos, e o mais usual e eficaz, era o planeamento da biblioteca ideal. Metodicamente construída, por género, época, autor e outros delírios classificatórios escolásticos. Tempos houvera em que tudo acabava na secção de banda desenhada: Skblllzzzzzzzzzz. Outros em que adormecera pelas prateleiras da poesia americana do século XX: Zzzzzzzzukofsky. O segredo era não perder nunca de vista livro algum até que a enormidade de volumes lhe esmagasse toda e qualquer célula acordada.

Hoje toma indutores de sono. Tem problemas de coluna e já não pode carregar pesos na cabeça.

segunda-feira, janeiro 10, 2005


Olha a novidade!

Nuno Morrais Sarrmento no Bom Bom à nossa custa.

domingo, janeiro 09, 2005


Hábitos tribais

Pedro Santana Lopes convidou Elsa Raposo para o segundo lugar na lista do Porto. Ela recusou, pois não queria perder credibilidade.

José Sócrates convidou Gertrudes Tomás para o primeiro lugar por Setúbal. Ela aceitou, em homenagem ao legado do marido.

Jerónimo de Sousa convidou Carlos Carvalhas para o último lugar na lista de Viseu. Ele recusou, pois era uma posição demasiado elegível.

Paulo Portas convidou Nobre Guedes para o primeiro lugar por Lisboa. E para o primeiro lugar pelo Porto. E para o primeiro lugar por Coimbra. E para o primeiro lugar por Faro. Ele aceitou, por espírito de corpo.

terça-feira, janeiro 04, 2005


O mexeriqueiro

No seu espelho, vê um homme du monde. Influente, abastado, movendo-se nas rodinhas certas. Um connoisseur de restaurantes, vinhos, máquinas potentes, gajas e essoutros adornos que lhe enfeitam o aplomb. Tem convicções, claro: a sua geração produziu mais convictos por milímetro quadrado que ratos o navio. Todos francófonos, por defeito. Excessivement ennuyeux, à Steinbroken. Chatos que nem hóstias, à moi.

Um tipo perfeitamente tolerável, em doses profiláticas, por efeito vacina. Em certos domínios e em particulares coutadas, quase inevitável: vem com a mobília. Sobretudo com a cadeira magistral. O que hoje me caiu em penitência, no entanto, é um híbrido: foi cruzado com porteira. Sabe rigorosamente tudo sobre toda a gente, do primeiro ministro ao último moicano. Tudo, no caso, é o pormenor insalubre, o mexerico fica-entre-nós, o guloso não-devia-contar-isto, o impante ninguém-sabe-mas. Seguro em fontes credíveis, fontes em primeiro ou segundo grau de proximidade, que o biltre conhece meio mundo e a outra metade não tem que conhecer.

O prazer que retira da bisbilhotice é quase físico. Estremece na gargalhadinha púbere, os olhos reluzentes de gozo, enquanto pela boca móbil de garoupa lhe escorre sumo de malícia, com um soupçon (hélas! a francesice é altamente contagiosa) de peçonha. Vibrante de picaresco revisteiro, invade o interlocutor com palmadinhas nas costas inundadas de cumplicidade balofa enquanto debita adultérios sem graça e intrigas rascas. É constitucionalmente impossível fazer-lhe entender que a maledicência não é a oitava arte. Plus ça devient vieux plus ça devient con...

segunda-feira, janeiro 03, 2005


Assobiando para o ar

Sentou-se em frente ao computador com o dia novinho, a cheirar a fresco de tanto estrear. O primeiro café, ao lado, na chávena desmesurada do gato laranja. O terceiro cigarro, maldita nicotina. Ora deixa cá ver as duas semanas de novidades, pensou de si para consigo. Horror! O sítio cheirava a naftalina de tanto mofar. O gang dos madraços tinha atacado de novo...